sexta-feira, 23 de novembro de 2007

A ESTÉTICA LITERÁRIA E O PICARESCO EM "MEMÓRIAS DE UM SARGENTO DE MILÍCIAS"


O século XIX, o Brasil foi marcado por transformações sociais, econômicas e culturais. Nesta última, assistiu-se a uma espécie de depuramento do estilo, quando se buscou substituir a estética arcádica pela concepção romântica. O advento do Romantismo fez surgir a cultura do folhetim, com narrativas que iam do dramático ao patético, as quais traziam, às famílias burguesas, cenas trespassadas por aventuras e tramas amorosas. Semelhantes às novelas televisivas da atualidade, os folhetins eram distribuídos esparsamente e a apreciação popular servia como termômetro para a direção dos capítulos subseqüentes. Quanto às personagens se destacavam, eram retrabalhadas; ao contrário, simplesmente desapareciam ou ficavam reduzidas. Além do mais, na narrativa havia um “fio condutor” e várias historietas ligadas a ele através de pequenos laços com a personagem principal ou com a trama básica. Para o leitor, a narrativa tornava-se tão mais interessante quanto maior fosse o dinamismo do enredo, a rapidez e a espontaneidade da cena, a movimentação das personagens. Em meio a esse modo de divulgação literária, alguns escritores arriscavam-se a veicular histórias que continham uma temática desinteressante sob a perspectiva do leitor. Este é o caso de “Memórias de um Sargento de Milícias”, escrita por Manuel Antônio de Almeida, no suplemento “A Pacotilha” do “Diário Mercantil”, nos anos de 1852 e 1853. Por distanciar-se da temática literária vigente a obra só foi reconhecida posteriormente, sobretudo pelos realistas, que perceberam no romance o primeiro indício concreto do seu estilo, sendo vista como uma obra precursora da estética realista. O primeiro texto crítico sobre a obra foi escrito por José Veríssimo (1894), o qual apontava para certas características estruturais, inaugurando uma espécie de escola interpretativa que veria nesse romance um dos mais ilustres representantes da expressão realista. Com efeito, desde o começo da narrativa, segundo Veríssimo, percebe-se uma deliberada preocupação por parte de Almeida em suprimir toda manifestação de idealismo romântico, caminhando em direção à realidade material que compunha às cenas, por meio do detalhamento do cotidiano e da verossimilhança. Outra manifestação, viria com Mário de Andrade (1940) que revelou a natureza picaresca da obra. Por fim, a interpretação dialogante, de Antonio Candido (1956), opta pela idéia do romance ser excêntrico, devido ao distanciamento de sensibilidade dos leitores da época. Também considera o romance pautado pela malandragem e não exatamente pelo picaresco. A obra teria um “realismo ponderado”, porque se for classificar outros elementos organizacionais do texto, estes são de inegável extração romântica, ressaltando, ainda mais essa ambigüidade genérica. Assim, torna-se necessário destacarmos o “costumbrismo” na obra, o qual aparece em inúmeras cenas: a cerimônia religiosa, as Folias do Espírito Santo, a dança do fado, entre outras, todas elas realizadas de uma maneira quase didática, sem nenhum vestígio de idealismo romântico. Dessa forma, estabeleceu-se a interpretação crítica sob uma dupla perspectiva: de um lado, a que parte de uma discussão baseada na dicotomia realista/ não realista e, de outro, a que segue o caminho da controvérsia dicotômica picaresca/não picaresca. No primeiro caso, trata-se de um documento social com um realismo, porque se volta para o mundo real, procurando mostrá-lo com veracidade. O idealismo dos namorados para se chegar ao casamento contrapõe a naturalidade do sensualismo. As personagens de “Memórias” são fêmeas e machos atraídos pelo sexo, prenunciando o Naturalismo. Assim, surge Vidinha, mulata fogosa que antecipa o comportamento das personagens femininas naturalistas e pode ser considerada a precursora de Rita Baiana, d’O Cortiço e da Gabriela, de Jorge Amado. O tom de crônica de costumes somente alcançou o reconhecimento da crítica e dos leitores depois do Modernismo. Já, no segundo caso, o protagonista tornou-se o primeiro malandro da novelística brasileira. Ele vive de expedientes por desamor ao trabalho, não passa fome e não sofre preconceitos sociais. Há um contraste entre o herói picaresco, personagem nas novelas espanholas do século XVI, cujas qualidades não se encaixam em Leonardo-filho. Este é um rapaz esperto, malandro, traquinas, sendo capaz de armar as maiores confusões, transformando-se num anti-herói. É de origem humilde e irregular, “largado, mas não abandonado”, ficando longe da condição servil. Seu padrinho quer vê-lo padre ou advogado e ele nunca se preocupa com a necessidade de ganhar a vida. Vive dos “acasos”, nada aprendendo com a experiência. Nasce já malandro feito, como se tratasse de uma qualidade essencial e não atributo adquirido por força das circunstâncias. Tem sentimentos sinceros, é leal e não bajulador. Casa-se com seu amor da infância e acumula cinco heranças. Contrariamente a essas características, o herói pícaro espanhol é moço ingênuo de baixa extração social, que cai na vadiagem e luta inescrupulosamente para matar a fome, além de não desejar trocar sua liberdade pela sedentariedade dos demais. Trabalha como servo, porque vai mudando de ambiente, mudando de patrões, variando a experiência e vendo na sociedade um conjunto. Essa experiência resulta na aprendizagem que amadurece e o faz recapitular a vida sob a luz de uma filosofia desencantada. O contato áspero com a realidade, o torna mentiroso, dissimulado e ladrão, sendo a maior desculpa das “picardias”. Terminam sempre desiludidos e miseráveis: traem os amigos, enganam os patrões, não amam e casam por interesse. Em relação às mulheres, demonstram certa misoginia (horror ao casamento). Com isso, pode-se dizer que a obra possui um picaresco mitigado. Mais uma vez, como no caso de sua filiação ao realismo, a obra apresenta-se como sendo de transição da estética romântica para a realista.

A ORGANIZAÇÃO TEXTUAL EM “MEMÓRIAS DE UM SARGENTO DE MILÍCIAS”


“Memórias de um Sargento de Milícias” consagrou-se com um único livro de Manuel Antonio de Almeida. Foi publicado, inicialmente, no suplemento “ A Pacotilha” do jornal Correio Mercantil, no Rio de Janeiro, em 1852 e 1853, para depois, aparecer publicado novamente em dois volumes em 1854, assinados por “um brasileiro”. Para escrever esta obra, Almeida baseou-se nas lembranças de um colega de redação, também jornalista, um português, que anteriormente havia sido um sargento de milícias, chamado Antonio César Ramos. Este era bom de prosa, exímio contador de “causos”. O autor pretendia narrar a acidentada vida de uma criança nascida no inicio do século XIX, mas acabou fazendo uma esplendida reconstituição do período nas camadas suburbanas. Em outras palavras, não é uma novela “picaresca”, mas uma “novela de costumes”, que retrata os hábitos dos habitantes do Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX, da época de D. João VI. Foram catalogados os costumes, os modismos, as conversas de esquina, as superstições, as festas de rua e as de família, a forma de vida e a linguagem, ou seja, toda uma gama de valores que determinaram as reações peculiares aos meios retratados. Escrito em pleno desenvolvimento do Romantismo, não se enquadra em nenhuma das racionalizações ideológicas reinantes, devido a maneira direta de focalizar os acontecimentos tanto temporal, “Era no tempo do Rei”, quanto espacialmente e por trazer o enredo muito diferente dos romances da época, sendo, talvez, a única obra do século XIX que não exprime uma visão de classe dominante. O autor se afasta da linguagem romântica e opta por uma coloquial e pelo ritmo popular. Considerada também novela, seus capítulos são unitários, quase todos contendo um episódio completo, os quais se dividem em duas partes. A primeira contém 23 capítulos, que abordam as diabruras do herói-criança em caráter de crônica com uma serie de quadros de costumes da época. Nesta parte, Leonardo-filho divide com o pai, Leonardo Pataca, o status de personagem principal. Já, na segunda, com 25 capítulos, são descritas as façanhas do jovem.A inclusão de costumes diminui, cedendo lugar para o desenrolar das paixões, cujo principal personagem é Leonardinho. A mola mestra da narrativa é o movimento, e não a análise de indivíduos. A rapidez com que transcorrem as cenas é tamanha que faz o crítico Antonio Candido classificar a obra como romance em moto-contínuo, isto é, um fato puxa o outro e assim por diante. Mario de Andrade assinala que o livro termina quando não há mais fôlego para travessuras, quando o “inútil da felicidade começa”, pois não são mais possíveis as peripécias do anti-herói. A ação do romance ocorre no Rio de Janeiro, sobretudo nas áreas que naquele tempo constituíam o grosso da cidade com pessoas livres e modestas. Por isso, a obra é um “documentário restrito que ignora as camadas dirigentes e camadas básicas”, já que eliminando o escravo e as classes dirigentes, suprimiu dominado e os dominadores, restando apenas a convivência das personagens entre licito e ilícito, que se ascendem socialmente ou não. Na sociedade descrita, a ordem comunica-se com a desordem constantemente. As personagens dividem-se entre as que vivem segundo normas estabelecidas socialmente, tendo no ápice o grande representante delas, Major Vidigal e aquelas que se opõem a elas. Logo, há um pólo positivo da ordem e um negativo da desordem, funcionando como dois imãs que atraem Leonardo. A dinâmica do livro pressupõe uma gangorra entre ambos pólos, como por exemplo, o caso de Leonardo-Pai que, inicialmente, faz parte da ordem, como oficial de justiça e, apesar de ilegítima, sua relação com Maria da Hortaliça é normal segundo os costumes do tempo e da classe social. Mas depois de abandonado por ela, entra num mundo suspeito por causa do amor pela cigana, que o leva às feitiçarias proibidas.Mais tarde, a cigana passa a viver com ele, até que, finalmente, já maduro, ele se “junte” com Chiquinha, a filha da Comadre, num relacionamento estável, embora sem a benção religiosa. Assim, representante da ordem, desce a sucessivos círculos da desordem e volta em seguida a uma posição relativamente sancionada. Segundo Antonio Candido, “o cunho especial do livro consiste em certa ausência de juízo moral e na aceitação risonha do ‘homem como ele é’, mistura de cinismo e bonomia que mostra ao leitor uma relativa equivalência entre o universo da ordem e o da desordem; entre o que poderia chamar convencionalmente o bem e o mal”, rompendo com o maniqueísmo romântico. Numa obra onde não há remorso e a avaliação dos atos é feita segundo sua eficácia, a repressão moral só pode existir nas leis que regem a sociedade. “É uma ‘questão de polícia’ e se concentra inteiramente no Major Vidigal, cujos deslizamento cômico para as esferas da transgressão acaba, no fim do romance, por baralhar definitivamente a relação dos planos.” A obra cria um universo que parece liberto do peso do erro e do pecado. Um universo sem culpabilidade e mesmo sem repressão, a não ser a repressão exterior que pesa o tempo todo por meio do Vidigal. (...) as pessoas fazem coisas que poderiam ser qualificadas como reprováveis, mas fazem também outras dignas de louvor, que as compensam. E como todos têm defeitos, ninguém merece censura”. No caso do padrinho, este enriquece por meio da traição e do roubo, mas “o narrador só conta isto depois que a nossa simpatia já lhe está assegurada pela dedicação que dispensou ao afilhado”.

OS TIPOS SOCIAIS EM “MEMÓRIAS DE UM SARGENTO DE MILÍCIAS”

Quando Manuel Antonio de Almeida escreveu sua única obra, “Memórias de um Sargento de Milícias” (1854), voltou-se para a confecção de personagens-tipo, isentando-as de constituição psicológica aprofundada. A construção de figuras planas é justificada pela preocupação com o coletivo. A obra não reforça a imagem “cor-de-rosa” dos leitores de seu tempo, mas mostra aquilo que eles não queriam ser, pois os anti-heróis não ocultam as mazelas do caráter, antes as mostram claramente. Em outras palavras, o objetivo maior da narrativa não é a análise profunda dos caracteres, mas descrever os tipos sociais que viviam na sociedade carioca do século XIX. Não é de interesse do autor revolver a individualidade de cada um dos personagens, particularizá-los ou desvendar-lhes a personalidade, pois desde o inicio, está mais propenso a fazer uma crônica de costumes, muitas vezes amarrada ao aspecto histórico, mas não necessariamente documental. Sua linguagem fácil, com vocábulos corriqueiros, visa a uma espécie de documentação da fala em camadas mais populares, de certa forma, adaptada a maneira de ser das personagens. Freqüentes também são as interferências do autor, dialogando com o leitor para meditem sobre o desenvolvimento da obra, em atitude claramente metalingüística. Para Mário de Andrade (1940), o romance possui características picarescas, já que o protagonista é um rapaz esperto, malandro, traquinas, sendo capaz de armar as maiores confusões. É de origem humilde e irregular, “largado, mas não abandonado”, ficando longe da condição servil. Nasce já malandro feito, como se tratasse de uma qualidade essencial. Com isso, pode-se dizer que Leonardinho possui traços picarescos, sendo considerado um anti-herói. Seu nascimento escapa do estilo romântico que envolve o casamento e a sacrossanta prole nascida do amor. Seus pais, Leonardo Pataca e Maria da Hortaliça vivem maritalmente, em relação “quase” normal. Abandonado pelos pais, acaba por ser criado pelo padrinho. Acrescenta-se ao quadro da formação de Leonardo os tipos com quem ele convive, marginalia de um ambiente que contribui para fazer dele um vadio-tipo da Literatura Brasileira, que desembocará no anti-herói moderno com tendências a malandragens, como Macunaíma. Ao novo tipo de herói corresponde uma nova concepção de heroína: Luisinha, moça roceira e tímida, sem graças de mulher, excessivamente magra e desarranjada, embora contasse com uma boa herança. Por ela Leonardo se enamora. Ela também é escolhida pelo vilão, mau-caráter, traiçoeiro e interesseiro José Manuel, que se utiliza do comportamento vadio do herói para separar o casal. O enlace de Luisinha com José Manuel propicia ao autor uma análise ferina dos casamentos da época. Entre o protagonista e sua pretendente está Vidinha, tipo bem elaborado de mulher brasileira que traz, aliadas à beleza, à sensualidade e ao espírito folgazão, à relação sem compromissos, porque a ela é possível amar sem casamento. Seus principais pares amorosos – Luisinha e Vidinha – constituem um par simétrico. A primeira da ordem, a mocinha burguesa com quem não há relação viável fora do casamento. Já, a segunda, no plano da desordem, é a mulher que se pode apenas amar, sem casamento, nem deveres. Quando Leonardo se reaproxima de Luisinha e o relacionamento culmina no casamento, a tonalidade do relato perde a essência das seqüências da mulata. Mario de Andrade assinala que o livro termina quando não há mais fôlego para travessuras, quando o “inútil da felicidade começa”, pois não são mais possíveis as peripécias do anti-herói É como se o narrador, como Leonardo, encarasse o casamento com seriedade, mas sem muito entusiasmo, demonstrando a concessão à moral burguesa. Sempre encobrindo as peripécias de Leonardinho, temos o padrinho, solteiro e solitário, que se afeiçoa ao afilhado que ficara sob sua guarda, chegando a contemplar com benevolência as não poucas travessuras do moleque. Como o padrinho ou barbeiro, outras personagens não tem individualidade, são identificados por suas profissões, todas bastante populares: a comadre é parteira, há o toma-largura, a moça do caldo, o mestre de cerimônias, o mestre de reza entre outros. Assim, podemos constatar que “Memórias de um Sargento de Milícias” foi o primeiro romance na Literatura brasileira a focalizar as camadas populares com cenas reais. As personagens são autenticas, não idealizadas, divididas entre o bem e o mal. Para isso, o autor abandonou a sofisticação das construções lingüísticas, aproximando sua obra de um linguajar oral, descontraído, em “estilo de conversa com o leitor” e arquitetou o estilo “malandro” de viver, característica de certos tipos brasileiros, que, dialeticamente, oscilam entre dois universos antagônicos, a ordem versus desordem.

sábado, 10 de novembro de 2007

A semântica na estruturação do fantástico no conto "O Gato Preto", de Edgar Allan Poe

Ao lermos “O Gato Preto”, percebemos a hesitação e a dúvida da personagem diante de acontecimentos tão extraordinários. Essa ambigüidade, “real versus ilusório”, é acentuada pelo fato da história ser relatada por um narrador autodiegético. Este conta suas experiências e possibilita vê-los através da sua interioridade. Daí, a dúvida se instala no receptor e se estrutura, principalmente, no “índice semântico”, cuja linguagem figurada anuncia o sobrenatural. Assim, Poe utiliza metáforas e comparações que antropomorfizam o animal. Emprega também símbolos, os quais nos remetem a literatura fantástica. As cores predominantes – o branco, preto e o vermelho – unidas à significação dos outros símbolos, adquirem um valor relevante. No título temos o "preto", cor que remete ao mundo das trevas. O branco simboliza a pureza e o mundo celestial. Já, o vermelho “cor de fogo” e de “sangue”, quando espalhado significa morte. No mundo animal, a escolha do “gato preto” e com nome de Pluto, deus do inferno, denota a anormalidade do narrador e a presença do gótico. Em muitas tradições, o animal é tido como servidor do inferno, simbolizando a fatalidade, e possui qualidades mágicas, pois vê espíritos e tem sete vidas. Poe pode ter dado esse nome à narrativa, devido às superstições existentes durante a Idade Média, pois mulheres que tinham íntimas relações com gatos, eram bruxas e associavam-se a demônios. Na narrativa, percebe-se aversão do protagonista ao animal, que após assassiná-lo, é surpreendido por um incêndio e seu pensamento se direciona ao gato que havia enforcado. Nesse trecho, o simbolismo do fogo aponta para o “mito da Fênix”, ave mitológica, quando queimada, renascia das próprias cinzas. O título já prenuncia o retorno, determinado pela figura que possui sete vidas. Além das cores associadas a símbolos, à evocação dos elementos divinos são importantes. “Deus” seria uma manifestação da transcendência, relacionando-se às premonições do narrador. Dessa forma, nota-se que a semântica intui-nos a perceber os acontecimentos fantásticos e fornece diversas contribuições, produzindo medo, espanto, terror e o suspense, criando um universo particular. O “excesso” funciona igualmente como “índice semântico”. No início temos um “animal excepcionalmente grande e bonito". Também, a utilização dos intensificadores - tão, tanto e muito - proporcionam esse efeito:“Era um gato negro – muito grande – tão grande quanto Plutão”. Esse excesso será o ponto comum dos temas que se relacionam com o olhar, cuja revelação do limite entre a matéria e o espírito fornece o pretexto às transgressões, como a metamorfose e o pandeterminismo. Este, no conto, refere-se ao processo causa-circunstância-pânico da revelação do mistério. Já, aquele, traduz-se pela multiplicação do gato. Seu aparecimento causa no início surpresa; depois, pânico e desespero. Outra condição do fantástico é o elemento baseado no folclore e na superstição popular. Por ser algo cultural, cada leitor o traduz conforme seu contexto histórico-cultural. Na narrativa, a experiência de um homem envolvido com um gato preto dá origem a dois temas essenciais: o “duplo”, visto como ligação com o mundo transcedental, onde o espírito livra-se das banalidades terrestres, ultrapassando os limites do comum; e, a “morte” que liberta a personagem do duplo, já que a convivência entre ambos se revela impossível. No conto, esses temas são determinados pela aparição e pelo olhar do felino, funcionando como mecanismo que provoca o desdobramento. Em relação aos elementos estruturadores do conto, temos um narrador autodiegético coexistindo em dois espaços: o objetivo e o subjetivo. O primeiro é rapidamente descrito, pois o protagonista penetrará, em seguida no segundo, que organizará seu interior e cujos limites são absolutos. Na história, a casa e o quintal são os lugares das experiências sobrenaturais, do perigo e da perda. Quando consegue transpor os limites do mundo exterior, o narrador entra em outro, formado por sua memória, retrospectiva, recuperando várias cenas em "flashback”. Os fatos relatados, segundo sua percepção, interferirão nas descrições do ambiente, mudando a sua natureza, visto que o mundo exterior cessa de ter uma realidade plena. No porão, o protagonista enfrenta seu próprio terror, sentimento desenvolvido por sua loucura. Nesse lugar, o macabro mistura-se ao real, e evidencia ainda mais, a ambigüidade. Essa indecisão, objetivo versus subjetivo, intensifica, ainda mais, a angústia da personagem que prevê os futuros acontecimentos. No espaço fantástico todo esforço é inútil, pois nesse lugar a vítima é encurralada pela fatalidade a qual está destinada. Logo, o narrador vivencia fatos particulares, que possuem espaço e tempo próprios, os quais se interligam, porque uma mesma experiência contribui para a progressão da personagem tanto espacial como temporalmente. Assim, o fantástico surge, amadurecendo de acordo com as exigências de uma ação lenta e dissipando-se conforme as de um desfecho rápido. Na narrativa, essa evolução temporal se acelera no momento da descoberta do segundo gato. A estrutura binária espacial é responsável pela ruptura do tempo cronológico. O monólogo da personagem contribui para romper a linearidade do tempo, pois é ele quem manipula os lapsos temporais, conforme as necessidades da evolução da história: inicia-se pelo final para, só depois, realizar uma volta ao passado. Esse “flashback” faz-se de uma maneira contínua, conforme sua memória. Mescla o passado remoto, empregando o pretérito perfeito, com o presente da narrativa, ajudado pela surpresa do narrador ao adentrar no universo fantástico. Esse resgate memorial permite ao protagonista vivenciar novamente os fatos que levaram a sua metamorfose, ao mesmo tempo que defronta-se com sua insanidade. Enfim, Poe se apoderou de uma série de recursos lingüísticos e culturais para suscitar terror e causar suspense neste enredo.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS EM MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS

“Memórias Póstumas de Brás Cubas” (1881) inaugurou o Realismo e introduziu o romance psicológico na Literatura Brasileira. Seu enfoque é a forma como seus personagens percebem as circunstâncias vividas, investindo na suas caracterizações interiores, com suas contradições e problemáticas. O meio utilizado por Machado de Assis para discutir a sociedade do segundo reinado é a abordagem da individualidade e do caráter das personagens. Prepotente, Brás Cubas, o protagonista, menciona seus defeitos e traz o leitor para de si. Segundo sua visão, o mundo é regido pelos seus desejos. Sua vontade impera, sendo entendida como egocêntrica. Na obra prevalece a ironia, como um forma para combater as verdades absolutas, das quais o personagem-narrador desacreditava a princípio. Machado utilizou-se desse recurso para o leitor desconfiar das declarações, pensamentos e conclusões de Brás Cubas. A digressão é outro elemento importante. Consiste na interrupção do fluxo narrativo, que envereda por assuntos desvinculados do tema inicial, mas mantendo com ele alguma analogia criada pela do narrador-personagem. Já, o "humor negro” foi outro recurso usado, a fim de exteriorizar o desencanto ante a miséria física e moral das personagens. No romance, percebemos algumas relações dissimuladas, tornando a vida um gozo cínico e arbitrário. Outras são verídicas, já que as personagens arriscam-se perigosamente, submetendo-se a situações perigosas. Dentre essas personagens, destacam-se aquelas que fazem parte da categoria dos opressores e as que integram a dos oprimidos. Brás Cubas é o defunto-autor. Nasceu em uma família abastada. Na infância foi mimado pelo pai. Cresceu dependente da autoridade paterna, não sabendo como decidir sua vida. Com o óbito do genitor, outras pessoas passaram a exercer essa função. A única oportunidade em que toma uma atitude é durante a partilha da herança. Logo, é fraco e dependente. Apesar desses defeitos, compara suas memórias com o Pentateuco, o qual Moisés também narra a sua morte, julgando-se superior ao herói bíblico. Ao longo da narração, mostra as características negativas de sua personalidade: apegado ao dinheiro, mesquinho, cínico, vingativo e preconceituoso. Em Coimbra, bacharelou-se, mesmo sendo um aluno medíocre. Também sofre de distúrbios psicológicos. Não é frágil, pois sustentou um caso amoroso com uma mulher casada, alimentando a relação pelo prazer de sobressair-se de Lobo Neves, que foi seu adversário político e o derrotou. Perseguiu a imortalidade e articulou uma vingança contra a sociedade, procurando imortalizar-se escrevendo um livro póstumo. Como defunto-autor, analisa o mundo que viveu. A narração em primeira-pessoa torna-o subjetivo, porque o afasta do mundo e porque se entrega a seus próprios sentimentos, já que faz evoluções de seu mundo interior, tentando rever seus atos para buscar sua paz, num relato de franqueza e inserção . Dessa forma, revela seu desejo principal: o sucesso, ambição que norteou suas atitudes. Virgília, mulher da classe alta, tinha caráter interesseiro e dissimulado. Não casa-se com Brás Cubas para unir-se a Lobo Neves. Aproxima-se e mantém um relacionamento extraconjugal com o defunto-autor. Fora ela quem conseguiu uma senhora para cuidar da casa onde se encontrava com o amante. Demonstra uma capacidade invejável: mentirosa, adapta-se ao casamento, ao adultério e a vida dupla.
Quincas Borba, homem livre e pobre, vai sofrendo uma série de transformações. Ele influencia o narrador com sua teoria do Humanitismo. Com isso, consegue ajuda financeira com a desculpa de expandir sua filosofia, o que não acontece. Sua teoria defendia a idéia de que as experiências de um homem integram um quadro de preservação da essência humana. Para Cubas, o Humanitismo convém para justificar sua existência vazia, dando-lhe um sentido para sua vida. D. Plácida, mulher livre e pobre, foi alcoviteira dos encontros entre os amantes. Sua vida sofrida resume-se em momentos de tristeza e de dificuldades. Dizia ser uma pessoa virtuosa, porém silenciava-se e auxiliava em troca de alguns trocados. Entre as personagens foi a única que sentiu remorsos pelas suas atitudes.Eugênia, mulher livre, era filha de Dona Eusébia. Possuía beleza e era “coxa de nascença”. Este defeito impedia um relacionamento amoroso, pois o protagonista era preconceituoso e indigna-se com a idéia de casar-se com ela, pelo fato dela pertencer a uma classe inferior a sua e por causa de sua deficiência física. Esse relacionamento indica uma situação na qual se misturam conflitos históricos, culturais e sociais.A narração da obra em primeira pessoa, nos dá a impressão de que os fatos se passaram exatamente como foram contados. Às vezes, interrompe a história para comentar com o leitor a própria escritura, fazendo-o participar de sua elaboração. Esse recurso é denominado de narrador onisciente intruso. Sua seqüência é determinada pelo encadeamento das reflexões do personagem-narrador. Organizados em blocos curtos, os 160 capítulos fluem o ritmo do pensamento do protagonista. Não há linearidade, pois a aparente falta de coerência narrativa é permeada por longas digressões, dissimulando uma forte coerência interna. Em suma, observa-se que existe uma tentativa de aproveitar-se das situações através de uma relação. Todos os fatos apresentam características de volubilidade, desencadeamento. No desfecho, ninguém acaba tirando vantagem de nada e acabam infelizes e frustrados. Com isso, Machado, numa narrativa centrada pelas relações sociais, quer representar o cinismo em que se dá a convivência no século XIX. A crítica da obra é a constatação do cenário contraditório da vida humana, olhada em sua parcela da classe alta carioca movida pela escravidão urbana e domiciliar.

A Farsa de Inês Pereira em foco

A Farsa de Inês Pereira em foco

A peça foi escrita por causa de um desafio feito pelos nobres. Cansados de serem desmoralizados nas peças de Gil Vicente, acusam-no de plagiar o teatro espanhol. Em resposta, ele sugere que lhe seja dado um tema, sobre o qual escreverá uma nova peça. O tema foi o ditado popular: “Mais quero asno que me leve que cavalo que me derrube”. A peça foi representada pela primeira vez ao rei D. João III, no convento de Tomar em 1523.
A história inicia-se com Inês Pereira cantando e fingindo que trabalha em um bordado. Reclama do tédio deste serviço e de sua vida, sempre em casa. A mãe, ouvindo-a, aconselha-a ter paciência. Lianor Vaz aproxima-se contando que um padre a assediou no cominho e diz que trouxe uma proposta de casamento a moça e lhe entrega uma carta de seu pretendente, Pero Marques, filho de lavrador rico. Inês aceita conhecê-lo. Pessoalmente, o acha desinteressante e recusa o casamento. Sua esperança, agora, está nos Judeus casamenteiros a quem encomendou o noivo de seus sonhos. Depois de haverem procurado muito, dizem ter encontrado um rapaz. Antes de vir conhecê-la, o Escudeiro, pretensioso e falido, combina com seu pajem as mentiras que dirá para enganar a moça. O plano dá certo e eles se casam. Mas, logo, o marido revela-se um tirano. Ele vai para a guerra, deixando-a guardada pelo seu pajem. Três meses depois, Inês recebe uma carta, avisando-a de que o marido morrera. Livre, não perde tempo. Aceita casar-se novamente, agora com Pero Marques. Recém casada, Inês encontra um ermitão pedindo esmolas que se identifica como um velho apaixonado. Já prevendo os futuros prazeres nos braços de seu amante, ela segue em romaria carregada nas costas por Pero e cantando suas felicidades futuras ao lado do marido com vocação para ser traído.
Construída em versos com sete sílabas poéticas e sempre rimado, a obra não tem um narrador. O que existem são rrubricas, isto é, anotações à parte da narrativa que servem de orientação para os atores ou para o leitor. São elas que esclarecem as questões de vestimenta, cenário, tempo, posição das personagens etc. A farsa estrutura-se a partir de sete quadros que se sucedem, organizados da seguinte forma: apresentação da vida de Inês, ainda solteira, com a mãe; conselhos de Lianor Vaz sobre o casamento; apresentação de Pero Marques; entrada do escudeiro; as desilusões do casamento; a viuvez de Inês Pereira e a vida de casada com Pero Marques.O tempo não é indicado. As cenas vão tendo seqüência não dando a idéia de tempo decorrido entre uma e outra. A única menção feita é do período passado desde que o Escudeiro foi à guerra até a chegada da notícia de sua morte: três meses.
A maioria das cenas se passa num mesmo espaço especificado apenas como a casa de Inês. Todos os personagens acabam passando por ali. Em alguns momentos, os personagens vêm se preparando no caminho para a casa, como acontece com Pero Marques, o Escudeiro e o Pagem, mas de nenhum desses lugares há indicações cenográficas específicas.
Há a predominância do discurso direto como meio para criar a trama. Uma vez que as personagens falam diretamente, o autor soube usar essa artimanha para garantir o humor. Na fala de cada uma encontramos marcas importantes na delimitação de suas características. A cultura popular assim presente no discurso das personagens e confirma as atitudes corrompidas no cotidiano da sociedade: a sexualidade, o desmascaramento do comportamento do clero e a intromissão na base da família de alcoviteiras e alcoviteiros.
Engenhosamente, Gil Vicente constrói as personagens, fazendo sua crítica aos tipos sociais, tentanto moralizá-los.
Inês Pereira é a personagem central, construída como alguém voltada para os prazeres carnais e ansiosa por realizá-los. Representa a moça casadoira, fútil, preguiçosa e interesseira. Casa-se duas vezes apenas para livrar-se do tédio da vida de solteira. Apesar de seu comportamento impróprio, consegue até mesmo a simpatia do público pela inteligência com que planeja seus passos. É resultado do sistema social do qual faz parte, por isso mesmo, um personagem atemporal.O diálogo de Lianor Vaz com Inês permite perceber tanto o papel da alcoviteira, a mulher que ajeita casamentos, revelando que a base da família está corrompida,tão comum na sociedade daquela época. A Mãe, apesar de dar conselhos à filha, acha importante que ela não fique solteira e se toma cúmplice das suas atitudes. Sua fala é conservadora. O primeiro pretendente e futuro marido, Pero Marques, é o parvo, “o asno que me carregue”. Apesar de ser ridicularizado por Inês, espera-a, casa-se com ela e sujeita-se aos seus caprichos e traições. A figura do parvo é freqüente nas peças do dramaturgo, garantindo, por meio da sua bobice e ingenuidade o riso fácil. Além disso, ressalta de modo implícito a inversão de valores da sociedade. Já, o Escudeiro, é o “cavalo que me derrube”. Mostra-se falso, fingido, mascarado e além de tudo pobre e endividado. Mesmo assim, não perde a pose tendo até mesmo um Pajem para servi-lo, o qual serve para realçar suas falcatruas e suas mentiras a fim de enganá-la e conseguir o casamento. Preocupado em arrumar uma boa esposa, finge, dissimula, engana, criando uma imagem de “homem discreto” que depois se revela um tirano, aprisionando a jovem dentro de casa. Termina morto por um pastor. É outra figura corriqueira na galeria de tipos vicentinos, retratando a busca pela vida fácil num casamento rendoso. O Ermitão é um padre e antigo flerte de Inês, cuja característica realça as intenções de traição da mulher e o caráter promíscuo do clero. Finalmente, Latão e Vidal são os judeus casamenteiros. Seres marginalizados, aparecem para realçar o tom cômico da peça e, assim como a alcoviteira, desmascarar a hipocrisia dos casamentos arranjados.

Obras Completas de Alberto Caeiro

“O único poeta da natureza”.

A obra “Poemas Completos de Alberto Caeiro” tem três partes: O Guardador de Rebanhos, O Pastor Amoroso e Poemas Inconjuntos. O surgimento de Alberto, segundo carta de Fernando Pessoa enviada ao crítico literário Monteiro Lobato, o “mestre dos heterônimos” foi protagonizado em 08/03/1914, quando o poeta acercou-se de uma cômoda alta, tomou um papel e começou a escrever, em pé, como fazia sempre. Redigiu 30 e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase, cuja natureza não conseguiu definir. Foi o maior triunfo de sua vida. Abriu com um título “O guardador de Rebanhos”. E, o que se seguiu foi o aparecimento de alguém dentro dele, a quem deu o nome de Alberto Caeiro, nome que surgiu por pura e inesperada inspiração. Logo após, pegou outro papel e escreveu outros seis poemas que constituem a “Chuva Oblíqua”. Ao surgir Caeiro, tratou rapidamente de lhe descobrir alguns discípulos. Arrancou do seu falso paganismo, Ricardo Reis. E, de repente, em derivação oposta a esse, surgiu um novo sujeito. Num ato, e à máquina de escrever, surgiu a “Ode Triunfal de Álvaro de Campos”. Como todos seus heterônimos, Alberto Caeiro tinha vida própria. Nasceu em Lisboa em 1889, mas viveu toda sua vida no campo. Não teve profissão nem educação, só a primaria. Tinha estatura média e frágil, cabelos loiros e olhos azuis. Fora órfão de pai e mãe e deixou-se ficar em casa, vivendo de pequenos rendimentos. Viveu com uma tia avó velha. Morreu tuberculoso em 1915. Considerado mais poeta do que pensador, sua obra representa a antítese da poesia metafísica e religiosa. Seu sensualismo o leva a escrever poemas inovadores, os quais o tornam o “mestre” de Álvaro de Campos e Ricardo Reis, os quais aprenderam com ele a filosofia de não filosofar, a aprendizagem do desaprender. Procura viver a exterioridade das sensações e recusa a metafísica, “Há suficiente metafísica em não pensar em nada”, caracterizando pelo seu panteísmo, ou seja, sistema no qual Deus é o conjunto de tudo quanto existe, a universalidade dos seres: “Pensar em Deus é desobedecer a Deus”. Com esse pressuposto, regressa a um primitivismo do conhecimento da natureza. Diante da possibilidade de se infilicitar com o sol, os prados e as flores que o contentam com sua grandeza, procura minimiza-los, comparando com eles próprios. Nessa redução do mundo fica mais latente “o nada”. Faz uma poesia da natureza, dos sentidos, das sensações puras e simples, por isso não se preocupou com o trabalho formal do poema. Compôs uma poética da contemplação, hiperbólica, de linguagem espontânea, discursiva e prosaica, ao extirpar do texto a conotação tradicional. Adota uma linguagem simples, direta, com a naturalidade de um discurso oral. Os versos simples e diretos, próximos do livre andamento da prosa, privilegiam o nominalismo, a "sensação das coisas tais como são". É o menos "culto" dos heterônimos, o que menos conhece a Gramática e a Literatura. Mas, sob a aparência exterior de uma justaposição arbitrária e negligente de versos livres, há uma organização rítmica cuidada e coerente. Por causa disso, é contraditório, atinge o poético pelo apoético, ou seja, conota quando denota, pois usa o inusitado. Enquanto tenta provar que não intelectualiza nada, é aquele que mais intelectualiza entre os heterônimos. Parece usar o raciocínio sem querer demonstrar isso. Faz uma poesia da natureza, dos sentidos, das sensações puras e simples, por isso não se preocupou com o trabalho formal do poema: "A sensação é tudo (...) e o pensamento é uma doença". Embora condene o pensamento, leva o leitor à meditação a partir do momento em que prega a realidade pelas sensações. Diz-se o menos intelectual, no entanto a simplicidade desconcertante com que poetiza o cotidiano torna-o profundo e complexo, uma vez que seus textos encerram a filosofia que ele faz questão de negar.